terça-feira, 16 de agosto de 2011

Um dia, Ele nos chamou de queridos...



        Século XIX. Uma menina,de uns pouquíssimos 7 anos de idade, aproximava-se dos restaurantes, com o cheiro de comida que emanava cada vez que um cliente abria a porta do estabelecimento. Perto dali, ela estava sentada numa calçada meio suja. De lá, via as pessoas passarem. Fingia não ver o descaso, com o qual lhe "observavam". Na verdade, estava faminta. O gerente abriu a porta. " Vá embora daqui, menina! Está atrapalhando a freguesia!": 7 anos de rejeição social lhe acompanharam pelas costas. E iam lhe empurrando para uma outra calçada, na qual pudesse apenas sentar e imaginar um grande prato de comida, que já pensava há uma semana. Seus pais eram pensamentos que a guiavam para um lugar que não sabia se iria chegar. Mas ela gostava da vida. Gostava de se sentir em pé. Porém, apenas algo não lhe fazia bem: esquecer em que dia estava. Não falo, necessariamente, sobre o dia, semana ou mês. Acontece que sempre planejava algo para o dia seguinte. E isso que planejava, denominava de " O dia de Hoje ". Quando deixava de cumprir uma missão que se auto-colocava, isso, sim, era o que lhe aborrecia por algumas horas.
         Procurou uma outra calçada. Sentou-se e colocou um boné no chão. Uma senhora, que passava, colocou alguns trocados. A menina se levantou imediatamente. Foi sua vez de gritar... " Senhora! O seu dinheiro! Tome-o! "
"Mas, vi aquele chapéu no chão!"- disse-lhe a mulher. " Exatamente! Queria apenas me certificar de que as pessoas preferem dar moedas para bonés, do que ajudar seres visivelmente necessitados. Obrigada!"
A mulher se foi meio confusa e deixou seu dom, o dom de não querer entender, dominar seus pensamentos que convergiam para seu casamento decadente... A menina, dessa vez, levantou sem os gritos de qualquer pessoa. Não sabia o motivo de andar tanto. Mas isso lhe aliviava o que dizia ter como peso nas costas. Todavia, esse peso que carregava não era o da rejeição social. Era a consciência que lhe atormentava se não esticasse os músculos, numa espécie de alongamento diário. E, por isso, andava meio saudável.
         Repetia para si mesma que a vida era como um vaso; se você quiser, ele se torna apenas isso; se não, ele ainda será apenas um vaso: tudo seria vida enquanto o infinito não morresse. Nada poderia limitar o dom que dizia ser seu próprio carinho." Tenho um carinho tão grande por mim, que acabei me tornando meu melhor namorado" - ela se dizia. E as noites que passava não eram confortáveis. Era frio. Às vezes, chorava por se sentir tão... descoberta. Mas sempre se colocava como aquela que poderia amar seus próprios caminhos, ainda que eles fossem puramente tempestuosos. As lágrimas que caiam vinham de águas que, outrora, tomara em torneiras de parques não muito distantes. Não entendia o motivo das pessoas tomarem Sol. E enquanto passeava pelas sombras, via seu vestido,meio sujo, refletindo em poças d'água que se formaram com uma chuva que não molhava as outras pessoas.
        Um dia desses, um homem,de uns cinquenta e tantos anos,aproximou-se da menina quando ela já estava "desmaiada" de tanto apenas imaginar certos banquetes. Levou-a para sua casa. Sua mulher, submissa e devota de Santa Bárbara, colocou-lhe numa espécie de banheira improvisada. Limpou-a. Tirou-lhe umas sujeiras antigas que tinha nos olhos e na consciência. Seus pés estavam imundos. Mas havia um coração que brilhava numa distância inacreditável! Do corpo, saia uma glória imensa, aquilo que chamamos de felicidade. Os cabelos estavam bem cuidados em cada toque de amor puro que se fundia aos cuidados com aquela linda criança. As lágrimas estavam carinhosamente bem guardadas. Não precisaria chorar de terror quando abrisse novamente seus olhos. Vestiram-na com roupas novas de algodão muito branco. Ela estava em paz. Não se entristeceu por não haver planejado isso para aquele dia. Afinal,não havia como. Não se sentia morta, pois "era tudo como apenas o vaso de antes". O céu lhe sorriu com um Deus vestido de garçon. E, então, ali estava o  seu banquete... Acho que estamos no século XXI.




Por: Caio Fernando

8 comentários:

  1. primo mto triste essa historia......

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  2. A beleza do século XXI, mas os vícios dos séculos de antes.

    Gostei muito!

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  3. Lindo esse texto! Realidade de antes,o mesmo de hoje.........

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  4. Meu querido, não vejo tristeza nesse texto. Vejo muita beleza! Algo de presente antes e hoje...

    Muito bom, olha! Parabéns, mesmo!

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  5. adoooooooreeeeeeeei!!!!!!!
    nosssaa! quem e vc....
    q escritor fenomenal q vc e....
    parabens msmooo!!!

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  6. Texto super diferenciado.Gostei bastante.Licença para ler esse texto para os meus alunos.

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  7. Esse texto é digno de ser escrito por vc, pois é perfeito.

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